Êxodo

Rafael Sá
3 min readJul 3, 2024

--

Photo by Brett Jordan on Unsplash

Para cada caminho existe um fim, mas o começo nunca é bem certo. Não sabemos com precisão quando começamos a trilhar o atual propósito, pois a gênesis do caminho é o seu próprio fim. Quando li para minha filha recém-nascida "O Mágico de Oz", não tinha a devida noção necessária para entender a sua filosofia. Apesar de encontrar ali um profundo senso irônico, fui iludido pelo mago/escritor, que de primeira não me revelou o seu sentido.

Mas hoje, acordei diferente e me pus a pensar no quanto nos perdemos em caminhos para os quais fomos literalmente transportados, em meio a tempestades gigantescas. De modo que, quando nos damos conta, já estamos à procura de um caminho mágico e de um redentor ilusório, que de alguma forma irá nos consertar. E o caminho parece desenhado para que no fim, só apareça o mago por trás das cortinas com suas mentiras.

Meu tempo na igreja foi quase isso: a busca aventuresca pelo ser mágico que, por meio de sua feitiçaria, me daria cérebro, coração e coragem. Mas a culpa não era e não é da instituição. A culpa é da consciência que, na ausência e carência de atenção, cria mecanismos de sentidos que imitam a realidade heroica, enquanto nos fazem caminhar.

Em Oz, o caminho termina onde começou, no ser "desabalado", longe das tormentas. Assim como na maravilhosa vida do gadareno, que se encontrava, segundo a Bíblia, assentado e em perfeito juízo. E ao que parece, o meu caminho com Jesus me devolveu ao sentido original do meu caminho. Agora, a travessia passa sempre e todas as vezes que quer se repetir, por mim mesmo.

O livro do Êxodo é a tentativa de um povo achar o seu caminho depois de ter se perdido e se escravizado no Egito. Seu nome em hebraico talvez expresse melhor a identidade deste meu texto aqui presente, quando, ao invés de falar de caminho, fala de nomes. Todo caminho é a representação oculta da situação de um nome. O nome do meu caminho sou eu mesmo, e as aventuras que percorri para chegar até aqui.

Às vezes, o que precisamos é tecer em nós o caminho de volta, chegar em si mesmo. Às vezes, isso se apresenta como uma ponte maravilhosa de horizontes, mas seu clímax é sempre desolador. E é aí que crescemos, quando abandonamos as fantasias e passamos a cultivar o nosso jardim.

A jornada da vida, como representada em "O Mágico de Oz", é repleta de desafios, ilusões e momentos de autorreflexão. Dorothy e seus amigos buscavam algo externo para preencher suas lacunas internas, mas no fim, descobriram que já possuíam o que buscavam. Da mesma forma, na narrativa bíblica do Êxodo, o povo de Israel atravessa deserto e dificuldades em busca da Terra Prometida, aprendendo valiosas lições sobre fé, identidade e resiliência.

Essa jornada nos mostra que, por vezes, nos perdemos em tempestades, buscando redentores ilusórios que prometem soluções mágicas. A verdadeira transformação, no entanto, ocorre quando enfrentamos a realidade, aceitamos nossas vulnerabilidades e cultivamos nosso próprio ser. É nesse processo de autoconhecimento e aceitação que encontramos a paz e o propósito.

Como o gadareno, podemos encontrar-nos "assentados e em perfeito juízo" ao lado de Jesus, retomando o controle de nossas vidas e navegando nossos caminhos com clareza e propósito renovado. O cultivo do nosso jardim interior, livre de fantasias e ilusões, é onde reside nosso verdadeiro crescimento e realização.

O caminho é tanto a jornada quanto o destino. E, ao final, percebemos que a busca por significado é, na verdade, uma busca por nós mesmos. Cada desafio, cada desilusão, cada vitória é um passo rumo ao autoconhecimento e à paz interior. E é nesse encontro consigo mesmo que encontramos a verdadeira liberdade e a capacidade de viver plenamente.

Rafael de Sá

--

--

Rafael Sá

O que sou? Uma casca sobre a qual repousa um nome. Um nome que unifica uma pequena narrativa.